quarta-feira, 24 de fevereiro de 2021

Apagou-se a luz


Apagou-se a luz, essa luz que já não vias com clareza pois os teus olhos já tinham enublado há vários anos. Talvez demasiado cedo te debilitaram as capacidades mas os teus sentidos permitiam que te orientasses na perfeição. Mesmo assim nunca perdeste a tua vontade de continuar a fazer as mesmas coisas. Adoravas as tuas bolas de ténis que conseguias trazer 2 e 3 na boca, ou a tua garrafa de "Dog Beer" que adoravas ir buscar ao mar. O cheiro da borracha atraía-te com grande vivacidade e apenas passaste a demorar mais tempo a encontrar. Busca, pára, senta, dá a pata, a outra, deita, "morta", upa, senta, para trás, para a frente,pára, devagar, não toca, junto, mais para trás, mais para trás, vai buscar.... e assim repetidamente mas cada vez mais devagar.

Apaziguaste com alegria e ternura a nossa vida após a partida do teu pai, o Yuri, e por várias vezes tentámos que também deixasses descendência para haver continuidade. Talvez por sentires as tuas condições físicas o teu organismo não tenha permitido que houvesse sucesso e assim termina a linhagem do Yuri e da Luna. 

Com a chegada da Maria, não saías do tapete do quarto a fazer guarda todo o dia e toda a noite. Quando ela começou a crescer andava por cima de ti sem que te importasses com isso. Não deixas algo de ti, mas encheste-nos a alma e deste uma grande lição.

Durante vários dias se viveu com a dúvida da decisão, a decisão do momento certo, a decisão da escolha entre nossa dor ou a tua dor. O teu sofrimento nunca seria opção e estaria sempre à frente do nosso egoísmo.

Adormeceste e deixas um vazio, um vazio de amor e dedicação que nos deste mas também recebeste. 

Foram grandes, do tamanho de um GRANDE OBRIGADO POR ENCHEREM O CORAÇÃO. 

Até já Luna.
Dá uma lambidela ao Yuri.
Dorme bem.

José Carlos Xabregas